Pai ou mãe é quem cuida?
Por Bruno Reis Pinto – Artigo com 588 palavras – Tempo de leitura: 03 minutos
Hoje em dia a chamada paternidade ou maternidade socioafetiva tem ganhado cada vez mais atenção no contexto jurídico.
Se anteriormente apenas o vínculo biológico ou a adoção tradicional conferiam o direito à paternidade/maternidade, com a evolução da sociedade e do direito brasileiro, o afeto ganhou papel fundamental na formação dos vínculos familiares.
Recentemente, houve, inclusive, a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por meio da Lei nº 15.240, de 2025, para estabelecer o dever de assistência afetiva pelos pais. Por meio desse dever, compete aos pais, além dos demais deveres já previstos em lei, “prestar aos filhos assistência afetiva, por meio de convívio ou de visitação periódica, que permita o acompanhamento da formação psicológica, moral e social da pessoa em desenvolvimento”, considerando-se assistência afetiva: “a (i) orientação quanto às principais escolhas e oportunidades profissionais, educacionais e culturais; a (ii) solidariedade e apoio nos momentos de intenso sofrimento ou de dificuldade; e (iii) a presença física espontaneamente solicitada pela criança ou adolescente quando possível de ser atendida”.
O não cumprimento desse dever pode acarretar, em alguns casos, o dever de indenizar por parte do pai ou mãe negligente e chegar até mesmo à perda do poder familiar (art. 1.638, inciso II, do Código Civil).
Entretanto, em caso emblemático, julgado pelo STJ em fevereiro deste ano, a justiça autorizou o rompimento do vínculo de filiação, com a exclusão do nome do pai do registro de nascimento (REsp n. 2.117.287/PR), ao serem constatadas “a inexistência de vínculo de socioafetividade entre o autor e seu genitor” e “a quebra dos deveres de cuidado do pai registral, consubstanciado no abandono material e afetivo do filho”.
De outro lado, em situações em que um vínculo de filiação se constitui a partir da convivência, do afeto e do desempenho contínuo das funções parentais — como ocorre, por exemplo, com avós que assumem o cuidado de seus netos em substituição aos pais biológicos (que os abandonaram), ou com padrastos ou madrastas que assumem as funções de pais ou mães dos filhos de seus companheiros —, é possível se reconhecer essa nova forma de parentalidade. O reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva autoriza a inclusão do nome do “pai” ou “mãe de criação” no registro civil e o surgimento da relação oficial de parentesco, da qual decorrem direitos e deveres recíprocos, inclusive os relativos ao cuidado, alimentos e sucessão.
Essa é a chamada multiparentalidade (ou parentesco que vai além do pai e da mãe biológicos ou adotivos).
Mas como é provada a existência de vínculo socioafetivo?
Enquanto a filiação biológica pode ser demonstrada por exame de DNA e a filiação adotiva decorre de decisão judicial, a parentalidade socioafetiva exige a demonstração da estabilidade, publicidade e continuidade do laço afetivo construído ao longo do tempo. Para tanto, podem ser utilizados diversos meios de prova, tais como: declarações do(a) filho(a) e do(a) pai/mãe socioafetivo(a) sobre o reconhecimento recíproco da relação de filiação; depoimentos de testemunhas que confirmem a convivência e o exercício das funções parentais; comprovação de dependência em planos de saúde, escolas, clubes ou serviços; registros fotográficos de eventos familiares — como comemorações, festas, formaturas; além de documentos que evidenciem a constituição da vida em comum, incluindo, quando existente, o vínculo conjugal ou união estável com o genitor biológico ou adotivo. Em suma, trata-se da comprovação de que, embora inexista vínculo biológico, está presente um vínculo afetivo sólido, público e contínuo, por meio do qual ambas as partes se reconhecem mutuamente como pai/mãe e filho(a).

